No meio do tumulto, uma figura se desatacou justamente pela falta de pressa. Uma vozinha, coluna encurvada, bengala de bambu, sacolas nas mãos. Ela cruzava a faixa de segurança arrastando os pés, olhando para o chão, um passo de cada vez, câmera lenta total. Botei o carro em ponto morto e esperei.
Ao final da travessia, ela me fez sinal. Queria um táxi. Beleza!
Ela embarcou por etapas: primeiro jogou a bengala, depois as compras, depois girou nos calcanhares e sentou. Por último, vieram as pernas. O processo de se ajeitar no banco e puxar o cinto levou mais uns 5 minutos. Atrás de mim, os carros indignados sem conseguir passar. Azar.
Destino: Petrópolis. Enquanto subíamos a Protásio Alves, minha idosa passageira contava um pouco de sua trajetória de vida. Mulher de um conhecido artista plástico, ela lembrou-se dos tempos de glória, de bajulação, convites para festas, viagens a Paris. E contou também, com um acento amargo na voz, como tudo isso acabou. Como foi esquecida pelo mundo com uma mísera aposentadoria do INSS por consolo.
Chegando ao destino, o aplicativo do celular gritou. Alguém precisava de táxi a duas quadras dali. Fiquei tentado a aceitar, mas a vozinha ao meu lado ainda precisava achar o dinheiro, pagar, guardar o troco, desembarcar, despedir-se... Relaxei.
Outras tantas corridas chamaram enquanto eu ajudava a idosa a descer, carregar suas compras, abrir seu portão. Recusei o convite para um chazinho alegando que Petrópolis inteira parecia precisar de táxi. Sai em disparada.
Rodadas algumas quadras, descobri a bengala de bambu esquecida entre os bancos. Voltei. A vovó ainda estava agarrada ao portão. Pecado!
Desliguei o taxímetro. Pedi desculpas pela pressa e aceitei o convite para o chá.
3 comentários:
Espero que hoje você também tenha desligado o taximetro e esteja curtindo o natal com a sua família. Feliz Natal.
Pecado!
alo Mauro....acredito conhecer a pessoa que falas........pena que não sabes o nome....abraços...
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