Oferenda aos Orixás

Duas garotas embarcaram no meu carro correndo. Estavam investindo a pouca grana que tinham em um táxi pois estavam atrasadas. Elas vestiam uniformes de uma conhecida loja de departamentos. Tinham implorado à chefe para saírem mais cedo, mas não tinha rolado. O jeito era correr. Vamos nessa.

Destino da corrida: Morro da Cruz. Antes, porém, uma parada em um galinheiro. Uma das passageiras desceu para uma compra rápida. Voltou com um galo enrolado em folhas de jornal. Ela trazia o embrulho embaixo do braço enquanto contava o dinheiro do troco. Normal.

A moça que comprou o galo estava atrasada para uma cerimônia de umbanda. Estava com medo que sua mãe de santo ficasse braba. Enquanto subíamos o morro, pediu licença para trocar de roupa. Como estava sentada atrás de mim, ficou à vontade. Prometi não olhar.

Depois de retirar uma vestimenta branca de dentro da bolsa, a moça pediu que sua companheira segurasse a “oferenda” enquanto ela se vestia, e jogou o galo embrulhado no colo da outra. Foi uma péssima ideia.

Incomodado por estar com as patas amarradas e enrolado em jornal, a ave começou a protestar, se mexer, cacarejar… sei lá. Só então, a outra garota percebeu que o galo estava vivo! E ficou aflita, e começou a tentar consolar o bicho - alisava o embrulho de jornal como quem acaricia um filho. Fiquei com pena dela. E do galo, claro.

Quando chegamos ao destino, a filha de santo já estava com o uniforme guardado e vestia um lindo vestido branco. Pagou a corrida e saiu correndo. A amiga a seguiu, ainda tentando entender o destino daquele galo.

A próxima passageira a embarcar, algum tempo depois, foi uma senhora idosa, muito alinhada, muito séria. Rodadas algumas quadras, ela bateu sutilmente em meu ombro e tascou:

- Moço, não é querer falar, mas tem uma calcinha aqui em cima do banco do seu táxi…

Aposto que foi lindo ver aquela filha de santo rodando a baiana em seu terreiro de umbanda.