terça-feira, 16 de abril de 2013
O taxista e o governador
Confesso que acompanhei o caso dos assassinatos dos meus colegas taxistas de Livramento e Porto Alegre com uma certa distância. Trabalhando ao volante de um táxi há longos 27 anos, aprendi a lidar com a violência que cerca minha profissão. Aprendi que uma das formas de encarar o perigo é, justamente, não pensar muito nele. Para continuar abrindo a porta do meu táxi para quem quer que me faça sinal, procuro não pensar em como a corrida pode acabar. Simplesmente vou trabalhando, tentando evitar que meu medo controlado se transforme em pânico. Por isso mesmo, acompanhei o caso dos assassinatos com uma conveniente miopia, mesmo que isso me causasse o embaraço de, muitas vezes, conhecer detalhes dos crimes pela boca de meus passageiros.
Assim que se tomou conhecimento dos seis assassinatos em série, muitos se apressaram em associar os crimes à ligação dos taxistas com o tráfico de drogas. Foi o tipo de comentário que mais ouvi, num primeiro momento. Parecia a causa mais provável, a hipótese mais plausível, apesar de leviana. Sempre refutei essa suposição fácil, mesmo porque, não conhecia pessoalmente nenhum dos colegas mortos.
Do pouco que acompanhei pela imprensa sobre o caso, foi justamente esse tipo de ilação maldosa que mais me deixou indignado. Não as conversas à boca pequena que ouvi de colegas, passageiros, amigos, pessoas que emitiram suas desconfianças em conversas informais comigo. O que mais me incomodou foram duas declarações que, lamentavelmente, ouvi do senhor Tarso Genro, Governador do Estado.
Assim que ocorreram os crimes, quando ninguém ainda supunha o que de fato havia ocorrido no interior dos seis táxis, o governador apressou-se em desvincular os assassinatos de Livramento e Porto Alegre - até ai, tudo bem, ele foi induzido ao erro, assim como a maioria da polícia. O que me causou estranheza foi, nessa primeira manifestação, com a categoria ainda chocada, que o governados salientasse a necessidade de os taxistas “de bem” denunciarem os maus colegas, que tinham ligação com o tráfico de drogas. Não me pareceu aquele o melhor momento para se tocar no assunto. Coloquei-me no lugar dos parentes que estavam chorando suas perdas, que poderiam ter ficado sem ouvir aquele tipo de insinuação. Mas vamos lá.
À medida que as investigações avançaram, as coisas começaram a clarear. Descobriu-se, por fim, que os seis taxistas eram pessoas idôneas, que perderam suas vidas trabalhando honestamente, servindo às comunidades das quais faziam parte. Descobriu-se que foram vítimas indefesas de um assassino frio e calculista.
Depois de todos os detalhes torpes revelados pela polícia (em uma investigação exemplar), que revelou a sordidez do assassino, ouço novamente nosso governador falando ao microfone da Rádio Gaúcha. Quando penso que ele vai usar o momento para tranquilizar a categoria, nosso mandatário volta a salientar a necessidade de se identificar e excluir do sistema os taxistas que teriam ligação com o tráfico de drogas e a prostituição infantil (?)!
Todos sabemos que existem problemas na categoria dos taxistas e que eles precisam ser enfrentados, que existem taxistas corruptos, assim como advogados corruptos, médicos corruptos e (ao que parece) políticos corruptos. Mas, com todo o respeito, que momento mais infeliz para se insistir nesse assunto, senhor Tarso Genro.
Penso que seria melhor que tivesse ficado quieto.
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4 comentários:
É típico desses socialistas tentar vincular as vítimas de crime a comportamentos de risco, como associação para o tráfico. E a bem da verdade eu não esperaria nada diferente da parte de um sujeito que deu guarida a um assassino fascista (Battisti) e cedeu espaços públicos para a realização de um evento de incitação ao genocídio (FSM).
Um socialista dando guarida a um fascista? Essa eu gostaria de ver.
Quanto aos comentários do Tarso Genro, realmente infelizes. Da imprensa espero tudo, mas do governador... aqui em Brasília, com o caso da professora assassinada por um crackeiro, todos esses programas sensacionalistas levantaram suspeiras sobre a conduta da vítima... como se fosse coisa do outro mundo um viciado matar por motivo torpe... sempre tem que ter algo por trás. E aí vem o preoconceito: contra mulheres, contra professores e taxistas.
Concordo com todas as linhas dessa tua crônica, meu caro Mauro Castro, inclusive com sua serenidade ao criticar com propriedade o governador. Muitos aproveitam para destilar seus posicionamentos baseados em politicagem. Durante os muitos anos de reportagem policial, aprendi que não deve definir os fatos sem provas porque nem tudo é o que aparenta. E mesmo diante dos grandes erros de interpretação cometidos, as pessoas seguem se manifestando conforme o que desejariam que tivesse sido e não como realmente é. Por isso tudo, sou sempre contrário à pena de morte e ao justiçamento em um mundo onde falta inteligência e sobra corrupção e prepotência. E lamento a ânsia que algumas pessoas têm se se mostrarem como detetives inteligentes ou videntes com bolas de cristal.
Faço de suas palavras as minhas e acrescento uma única frase.
Nós, taxista devemos nos organizar melhor e com mais clareza para que não pareçamos oportunistas de plantão ou como meia dúzia de laranjas podres da categoria.
Abraço!
Jeferson Peixoto
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