Acontece sempre comigo. Estou parado na sinaleira, um motoqueiro para ao meu lado, levanta a viseira e me pergunta com aquela pressa de quem sabe que o sinal logo vai abrir: “taxista, sabe onde fica a rua...?” Antes mesmo que ele diga o nome da rua, eu já sei que vou me embananar todo, porque que não consigo encontrar respostas sob pressão, correndo contra o relógio.
Mas o que aconteceu esta semana foi pior. Eu vinha subindo a Mal. Floriano, no Centro Histórico, onde só os táxis circulam. Primeira marcha, abrindo caminho por entre os pedestres. Bem na esquina da Andradas, uma mulher fez sinal para que eu abrisse a janela. Queria perguntar alguma coisa. Ela levava uma criança no colo e segurava outra pela mão. Pela forma como estavam vestidas, via-se que eram muito pobres. A informação que a mulher me pediu deu um nó na minha cabeça.
A mãe das crianças perguntou se eu sabia onde ficava, por ali, um orfanato de freiras onde ela podia entregar suas filhas para adoção, pois não tinha mais condições de criá-las! A mulher disse que tinha ido a um programa de rádio, procurar ajuda, onde tinham indicado o tal orfanato no Centro da cidade.
Minha cabeça travou. A expressão suplicante da mulher dava a entender que ela esperava de mim mais que uma resposta. Esperava uma saída para sua situação. Os olhares perdidos das crianças só aumentavam minha confusão mental. Eu, óbvio, não sabia o que dizer!
Lembrei-me de uma igreja (ou algo assim) no alto da rua Vigário José Inácio, acho que já vi umas freiras entrando lá. Falei também em Bolsa Família, creches comunitárias, coisas desse tipo, mas um pequeno congestionamento formou-se atrás do meu táxi. As buzinas começaram a soar. A cidade tem pressa.
Segui em frente, controlando pelo retrovisor, até que a mulher e suas filhas foram engolidas pela multidão da Rua da Praia.
Tenho um guia de ruas no carro, como todo taxista, mas algumas respostas não cabem no meu porta-luvas.
5 comentários:
alo amigo Mauro
muitas são as perguntas / para a quais / não se encontram respostas / cheguei agora junto ao leito / onde minha companheira / dorme a meses / sono surreal
ler teu depoimento / coincidentemente neste instante / constrangeu minha tristeza / pra onde se olhe / se vê perguntas / sem respostas / estas que estamos / impossibilitados sequer / de pensar existir
respostas não cabem / no teu porta-luvas / nem em qualquer / outro lugar / resta seguir / cuidar dos nossos / que de nós dependem / e tentar não / ‘enlouquecer”
ricardo garopaba blauth
Crônica de cortar o coração. Fui lendo e pensando nas próximas linhas, onde leria que o taxista mandou os três entrarem, levou-os para um abrigo, negociou suas adoções, e esta feliz com mais duas criaturas carentes em casa. Só espero que ao ler este comentário não me responda que sabe onde encontrá-las e eu posso adotar sem nenhum problema. Continuo de coração cortado.
Eduardo
Não sei onde estão essas crianças. Espero que estejam bem.
Quem me conhece sabe que no quesito adoção, já fiz minha parte.
Há braços!!
Mauro, foi só por essa razão que fiz o meu comentário. Com qualquer outra pessoa não poderia fazer.
Já fui obrigada a usar o mapa do taxista. Depois de morar mais de 30 anos numa ilha. Mas tem hora que dá branco mesmo. No caso o coração escondeu o mapa. Imagine despachar crianças usando o mapa do taxista!
Abração.
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