Tudo começa quando o taxista retira seu carro novo em folha na revenda. Ele será entregue com uma certa cerimônia. Um funcionário explicará o funcionamento básico, passará as chaves e desejará boa sorte. O taxista, então, sairá rodando orgulhoso, cheio de cuidado, como quem pisa em ovos. O momento deve ser bem aproveitado, pois aquele carro imaculado (virgem) está com as horas contadas.
O veículo já pode ser levado direto para a oficina de pintura, onde será desmontado, lixado e pintado com a cor padrão táxi. É uma espécie de rito de passagem pelo qual todo táxi de Porto Alegre passa. Aquele carro inocente, desarmado, sairá pintado para a guerra, munido de faixas laterais, taxímetro, luminoso no teto e figa no retrovisor, porque um pouco de fé também não faz mal a ninguém.
Taxistas mais românticos colocarão capas nos bancos, capa na direção, tapetes extras e um engate de reboque para proteger a traseira. Tudo na vã tentativa de preservar a integridade do pobre autinho que está prestes a cair na vida. Um minuto de silêncio...
Depois de abrir a porta para o primeiro passageiro, não resta outra alternativa senão seguir em frente. Muitos outros clientes virão. Além da maioria educada e cordial, virão também bêbados virando cerveja, madames com seus cachorros, atletas suados, crianças comendo picolés, assaltantes armados, compras com embalagens furadas além de todo tipo de secreção humana da qual é melhor nem falar.
Nos primeiros dias de praça, o táxi será elogiado por sua firmeza, maciez e cheirinho de novo. Elogios que irão rareando com o decorrer do primeiro mês de praça até não serem mais ouvidos. Mal comparando, os mesmos elogios que uma prostituta em começo de carreira deve ouvir, até que o viço da idade vá se perdendo entre os lençóis de sua vida nada fácil.
Acabo de trocar meu táxi. O primeiro passageiro a usá-lo foi um gordo suado, que falava ao celular. Inaugurou meu carro sem o menor pudor, pagou a corrida, bateu a porta e se foi. É assim mesmo. Quem se importa com os sentimentos de um táxi?
9 comentários:
eu até evito bater porta dos taxis, e quando o veículo é limpo e bem cuidado eu até me animo a deixar 2 pila a mais pro piloto tomar um café...
Linda, poética e verdadeira as analogias usadas neste magnífico texto!
"Vida de carro de praça e puta, não são fáceis!"
Até um taxi merece alguém mais cuidadoso pra sua primeira vez, né?
Ao menos todos esses passageiros, com suas compras em sacolas furadas e todas as suas excreções, trazem boas histórias. Pelo menos pra o blog.
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Parabéns pela troca, e boa sorte com o novo carro.
Parabéns pelo carro novo. Quero dizer, usado.
Boa sorte com ele. Que renda boas histórias, sempre com final feliz.
É o destino, meu caro: saiu da loja já é carro que deprecia a cada dia. Mas do ponto de vista de vida, vale cada dia mais. Um carro sem história é só alumínio e ferro reciclado.
Boas viagens!
Legal. Assim na vida como na arte...
Parabéns, Mauro!
Muitos sucessos com o carro novo.
Forte abraço!
É meu amigo você me fez lembrar que daqui alguns dias vou passar por isso pois também estou nesse processo de troca de carro e lendo sua postagem comecei a sentir aquele sentimento ruim de ter alguém destruindo aquilo de que temos todo o cuidado do mundo para que dure o máximo possível você resumiu muito bem esse sentimento deu até dor no coração imagine você que li em um blog o qual não me lembro agora que o blogueiro reclamou que pegou um taxi e o taxista pediu que ele tirasse o pé do painel pois iria arranhar e mesmo achou ridiculo o taxista considerar o carro como um patrimonio
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