Tenho um passageiro, o Tavinho, que ocupa a maior parte do seu tempo estudando para concursos. Formado em direito, seu objetivo agora é tornar-se juiz. Para isso, ele presta concurso onde quer que eles estejam acontecendo. Volta e meia, levo-o para o aeroporto. Ele viaja por todo o pais atrás dos tais concursos. Um obstinado.
Natural do interior do estado, Tavinho vive em Porto Alegre sustentado por uma tia, juiza aposentada, sem filhos, que sonha ver o sobrinho à frente de um tribunal. Para tanto, a boa senhora remete todo o mês uma boa quantia em dinheiro para que o afilhado não passe trabalho na capital. Meu passageiro até que se esforça, mas já está neste chove-e-não-molha há um bom tempo e nada de passar no tal concurso. Dobrando a esquina dos trinta anos, ele já dá sinais de que talvez nunca chegue a bater o bendito martelo de madeira.
Obcecado pelos concursos, sempre com apostilas e livros embaixo do braço, Tavinho tornou-se uma figura esquisita, diferente dos jovens da sua idade. Como dinheiro não é problema, volta e meia meu passageiro tenta investir em algo que o faça parecer um cara legal.
Certa vez, ele comprou uma prancha de surf. Estava saindo em férias e decidiu, de uma hora para outra, que queria surfar. Assim que voltou a Porto Alegre, levei-o a um brique, onde vendeu a prancha com a qual não conseguiu pegar uma onda sequer.
Esta semana, ele me apareceu com uma guitarra dentro de um estojo. Disse que tinha visto o instrumento na vitrina e resolveu arriscar: comprou com estojo e tudo e foi para casa aprender a tocar. Queria que eu o levasse até a loja, onde pretendia trocar o produto, pois aquele estava com defeito: por mais força que usasse contra as cordas, a maldita guitarra não tocava. Tive que explicar ao Tavinho que guitarras elétricas para "funcionar" precisam ser ligadas a um amplificador...
Talvez seja melhor mesmo que Tavinho não passe no concurso: o judiciário já tem problemas demais sem ele.
11 comentários:
Passando para desejar um bom final de semana!
Beijos meus
ótimo !
( A gente fica tentada a não deixar comentario, afinal, esta sempre ótimo o que se lê aqui e não há exatamente o que comentar apenas deleita-se com as incriveis estorias)
Exatamente!
mas talvez até - há essa chance - de ele ser daquelas pessoas que só sabe ser de um jeito (nesse caso, só sendo juiz mesmo).
Data venia, só se for o martelo de bife.
Bem julgado!
Tavinho precisa saber o que é bom pra tosse,suar um cadinho e deixar o dinheiro da tia;esse monte de livros e apostilas ou não estão sendo lidos ou ele precisa procurar outra coisa pra fazer;que não malhe muito a cabecinha dele.
É isso que dá essa tecnologia de conexão sem fio.
Essa "ignorância" é própria de especialistas.
Sugere pra ele que faça curso pra juiz de futebol.
Abraço e boa semana.
Tavinho é o chamado "mimado".
abarços Mauro
Gosto dessa maneira de criticar situações e comportamentos na forma de parábolas. Melhor usar histórias do que o ranço panfletário direto que ofende e não leva a lugar algum a não ser reações algumas vezes desproporcionais. Mesmo sem dizer, sem generalizar, sabemos as mazelas de tantos segmentos da sociedade, em que nem juízes escapam. Ao Tavinho, sorte e um encontro com seu ideal, seja lá qual for.
Alguém já me disse que esse negócio de concurso é pra pessoas sem talento. Tudo em nome da estabilidade.
Não importa a natureza da ocupação, importa o salário. Se o cara vai ser policial ou auxiliar de não-sei-o-quê no judiciário, fica em segundo plano.
Por isso temos tantos servidores públicos que parecem mortos-vivos.
hehe... gostei da sugestão: juiz de futebol!
...não esqueça de fazer sua declaração de imposto! kkkk.. ontem recebi o pagamento por fazer uma declaração do pessoal aqui da empresa: uma caixa de bombom! Viu como eu cobro caríssimo? hehehe
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